[Opinião] Controle do UTWT pela UTMB e o futuro do circuito

Quem escreve é Sergio Mayayo, editor do Carrerasdemontana.com. Hoje quero falar do futuro do Ultra Trail World Tour, o grande circuito de ultras criado em 2014. Um circuito que pude acompanhar ao vivo desde que nasceu, visitando quase a metade das corridas realizadas e onde os corredores espanhóis se saíram especialmente bem, com vitórias de Núria Picas e Pau Capell, assim como pódios de Jordi Gamito, Maite Maiora, Pablo Villa, entre outros. Os campeões históricos foram sempre grandes corredores, de Gediminas Griniu a François d’Haene e Courtney Dauwalter.

No recém anunciado calendário 2020, vimo que o UTWT segue crescendo: agora são 28 corridas, incluindo três da nova marca “By UTMB”. E promete ser muito, muito mais, porque durante a primavera passada o encarregado pela expansão internacional do projeto, Remi Duchemin, anunciou oficialmente em teleconferência que toda “by UTMB” também seria automaticamente uma corrida do UTWT.

Como pode Remi Dumechin dizer isso? Porque desde 2019 há novos proprietários do circuito e agora o conselho de administração é formado por Remi, Michel e Catherinne Poletti, assim como Paul Kelly. Por outro lado, a equipe de gestão do UTMB também gestiona a Ultra Trail World Tour e por isso mesmo, Remi podia nesse momento anunciar publicamente também seu objetivo que até 2027 haverá 20 corridas “by UTMB”. Dito isso, o objetivo a médio prazo do circuito parece ser seguir crescendo até agrupar umas 50 corridas.

Esse plano de expansão empresarial desde Ultra Trail World Tour S/A gera problemas com corridas independentes. Esse crescimento explosivo pode ser totalmente lógico para aumentar o valor da empresa, mas gera muitos problemas às provas independentes, aquelas que não são propriedade ou franquia da equipe formada pelos Poletti. Assim, por exemplo, se há uma oportunidade comercial para realizar uma nova corrida “by UTMB”, mas há conflito de território ou data (ou ambos) de uma corrida independente, associada à UTWT… o que acontecerá?

Esse conflito entre UTMB e corridas independentes já aconteceu: em 2019 a UTMB lançou a Ushuaia by UTMB entre os dias 05 e 07 de abril na Patagônia Argentina, com competidor direto da Patagonia Run de 12-13 de abril, corrida associada à UTWT. Na mesma Patagônia Argentina e com apenas uma semana de diferença! Obviamente a Patagonia Run, como integrante da UTWT SA gestionado pela equipe Poletti, teve um prejuízo direto com a mesma equipe que lançara o Ushuaia by UTMB. Da mesma forma, com o lançamento na Espanha do Val D’Aran by UTMB entre os dias 02 e 05 de julho de 2020 pode causar um problema tanto para as provas espanholas Transgrancanaria e Penyagolosa Trails por compartilhar o mesmo território, em relação ao atleta internacional, como para a Lavaredo Ultra Trail que acontece nos dias 26 e 27 de julho, porque ele pode voar para Dolomitas ou Pirineos.

O compromisso: olhando para o futuro, as corridas independentes incomodadas com essa situação incluíram duas garantias. Por um lado, uma cláusula de saída em 2021 se as promessas e expectativas de melhorias de comunicação necessárias não forem cumpridas. Por outro lado foi criado um comitê de diretores de prova, com a inclusão do próprio Michel Poletti, que tomará decisões conjuntas em relação às decisões tomadas apenas pela UTWT SA até agora.

O que pode acontecer em 2021? A priori se abrem quatro cenários, que podemos resumir em dois continuistas e dois de ruptura.

– O continuísta seria seguir mais ou menos como está, sob a marca Ultra Trail World Tour e adicionando cada ano novas corridas ‘by UTMB’. Com apenas 4 foram criadas e o objetivo estratégico oficial declarado por Remi é 20, obviamente esse cenário leva a que UTWT gestione 40-50 corridas a médio prazo no circuito.
– A segunda opção continuísta seria que, dado o controle de ambas marcas UTMB-UTWT pertence aos mesmos acionistas e que em pouco anos a maioria das corridas do World Tour sejam corrida UTMB… se aposta numa lógica sinergia de marketing, juntando tudo sob uma só marca, que acolheria assim os antigos independentes, rebatizando-os como Hong Kong 100 by UTMB; Lavaredo by UTMB, etc.
– O cenário rupturista acontece quando um número suficiente de provas independentes e relevantes a nivel mediático aposta na separação e criação de um novo projeto conjunto que não seja gestionado por Michel e Catherinne Poletti. Neste caso, abre-se duas novas vias: por um lado, criar um novo conceito desde zero e lançar entre elas; ou unir-se a uma grande marca global de eventos esportivos que as apoiem.

– Neste último caso, poderiam apostar em marcas oficiais como a Ironman (que já é proprietária da Ultra Austrália e Tarawera Ultra) ou Spartan, assim como alinhar-se com o único circuito oficial reconhecido pelo atletismo mundial, como é a Copa do Mundo da World Mountain Running Association, que em suas 22 edições anteriores não teve percurso de mais de 42 Km, mas cujos estatutos não limitam essa distância, diferente da Skyrunning, que publicou há um tempo que as provas de seu circuito não podem exceder as 16 horas de duração e cujo percurso mais longo hoje é o 74 Km da Transvulcânia.

Se quiser saber mais sobre o tema, no site Carrerasdemontana.com publicamos um especial com as opiniões de 15 pessoas chave, incluindo cinco diretores da provas UTWT (Transgrancanaria, Penyagolosa, Volvic VVX, Mozart 100 e Val d’Aran by UTMB), assim como corredores de elite e jornalistas de todo o mundo.

Infelizmente não foi possível incluir opiniões de Marie Sammons (diretora executiva UTWT) apesar da solicitação pessoal desde setembro em Chamonix até a semana passada após a divulgação do calendário 2020.

Para encerrar, o certo é que a arriscada jogada empresarial

Finalmente, a verdade é que a arriscada jogada empresarial realizada pela UTMB com a gestão do circuito Ultra Trail World Tour confidencialmente, sem que as corridas do circuito soubessem até vários meses depois, geraram muitas tensões. A isto foi adicionada a tomada de decisão crítica, como a entrada automática de qualquer corrida “by UTMB” ou designar o tripo valor nas referidas provas para conquistar um número em Chamonix.

Então … com tudo isso acontecendo, em 2021 as espadas estarão erguidas e não sabemos qual dos quatro cenários será confirmado. O que você veria mais provável no momento?

As opiniões e visões expressadas nesse texto são exclusivamente do autor, não refletindo necessariamente a opinião do site Adventuremag.

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