Análise de variáveis fisiológicas e ambientais durante uma corrida de aventura

Monografia apresentada ao Curso de Educação Física do Centro Universitário de Belo Horizonte UNI-BH, como requisito parcial à obtenção do título de bacharel e licenciado em Educação Física.

Área de concentração: Saúde
Orientador: Ph.D Fabiano Trigueiro Amorim

1. Introdução
Criada na década de 1980, na Nova Zelândia, a Corrida de Aventura é uma competição que tem como objetivo percorrer uma distância pré-determinada realizando diversas modalidades esportivas como: mountain bike, trekking, canoagem, técnicas verticais, cavalgada, patins, dentre outras. As provas de corrida de aventura pode ser divididas em corridas de velocidade (<6 hoas), corridas intermediárias (6-12 horas), corridas longas (12-36 horas) e corridas de expedição (>36 horas). Os eventos de Corrida de Aventura podem exceder mais de 100 horas de duração levando os competidores ao limite da exaustão. Freqüentemente, os atletas competem por dias seguidos sem descanso e limitadas horas de sono. As equipes são formadas geralmente por 4 atletas sendo um integrante do sexo oposto (TOWNES, 2005). Vence a equipe que percorrer, sem dispersar, a maior distância ou todo os percursos programados, passando pelos postos de controle previamente estabelecidos pela organização da prova (ASHLEY et al., 2006; LUCAS et al., 2008).

O local específico das Corridas de Aventuras bem como o terreno que os atletas irão percorrer é disponibilizado poucas semanas antes da competição, tornando difícil a preparação específica dos atletas para o evento (FORDHAM; GARBUTT; LOPES, 2004).

Dentro de uma mesma equipe encontram-se atletas com diferentes aptidões físicas e técnicas (LUCAS et al., 2008). As demandas fisiológicas durante a competição são extremas, levando grande número de competidores a desistirem e abandonarem a prova (FORDHAM; GARBUTT; LOPES, 2004; ZALCMAN et al., 2007).

A corrida de aventura tem se tornado um esporte popular Greenland (2004) e a literatura atual disponível não contempla as características fisiológicas e ambientais ocorridas nas competições. Essa falta de informação é provavelmente devido ao seu desenvolvimento relativamente recente, aos locais remotos dos eventos, a falta de conhecimento prévio sobre o percurso e as limitações associadas com a coleta de dados no campo (LUCAS et al., 2008).

1.1 Objetivos

1.1.1 Objetivo Geral:

Analisar as variáveis fisiológicas e ambientais de atletas durante uma corrida de Aventura.

1.1.2 Objetivo Específico:

– Registrar e analisar a freqüência cardíaca dos atletas durante o percurso;
– Analisar o gasto calórico dos atletas durante a competição;
– Calcular a perda de massa corporal dos atletas;
– Registrar a ingesta alimentar dos atletas durante a corrida;
– Medir o estresse térmico durante a competição.

1.2 Justificativa

Com essa investigação esperamos identificar o estresse fisiológico que os atletas estão sendo submetidos e proporcionar subsidio para elaboração de treinamentos futuros e específicos para essa “recente” modalidade.

2. Desenvolvimento

2.1 Revisão de Literatura

2.1.1 Histórico da Corrida de Aventura

Inspirado nas corridas multi-esportivas realizadas na Nova Zelândia na década de 1980, o repórter francês Gerard fuzil, criou a primeira Corrida de Aventura, o Raid Gauloises (The Raid), considerada a primeira corrida oficial descrita. O evento foi realizado junto à natureza, onde equipes de atletas de ambos os sexos percorreram áreas remotas realizando modalidades esportivas como corrida de montanha, técnicas verticais, remo, orientação e mountain bike. (Adamson, 2004)

De acordo com sítio especializado (Adventuremag, 2000), a segunda corrida de aventura foi a Southern Traverse, em 1991. Posteriormente, em 1995, Mark Burnett, empresário e competidor das duas edições anteriores do The Raid, criou o Eco-Challenge e firmou uma parceria com o Discovery Channel para transmitir o evento em todo o mundo. O primeiro Eco-Challenge aconteceu no estado de Utah, nos Estados Unidos da América, e conseguiu atrair a atenção de patrocinadores e novos adeptos do esporte. Desde então, o Eco-Challenge foi realizado na Colúmbia Britânica, Marrocos, Argentina, Malásia, Nova Zelândia e a mais recente edição aconteceu em Fiji, em 2002.

Recentemente, tem havido um aumento na popularidade de Corridas de Aventura nos Estados Unidos e em todo o mundo, com o número crescente de eventos e de participantes a cada ano, principalmente eventos mais curtos de 1 a 2 dias de duração. (Townes et al., 2004)

No Brasil, a corrida de aventura surgiu após Alexandre Freitas ter participado de uma edição do Eco-Challenge (1997). Alexandre Freitas criou a Sociedade Brasileira de Corridas de Aventura (SBCA), organizadora da primeira Corrida de Aventura brasileira, denominada Expedição Mata Atlântica – EMA. A primeira edição da EMA aconteceu em 1998, com duração de 3 dias e um percurso de 220 km de distância. Nesse mesmo ano, o Brasil foi representando pela primeira vez no Eco-Challenge com a equipe mineira Brasil 500 anos (ADVENTUREMAG, 2000). No ano de 1999 a EMA se deslocou do litoral norte para o litoral sul de São Paulo e aumentou de tamanho, passando a ter um percurso de 400 km e até 5 dias de duração (ADVENTUREMAG, 2000).

Com a popularização do esporte no país, começaram a surgir vários eventos, possibilitando um número maior de pessoas ingressarem no esporte. As corridas com 1 ou 2 dias de duração possibilitaram a participação dos atletas de final de semana que não dispunham de tempo e recursos financeiros para o treinamento e competição sistematizados (ADVENTUREMAG, 2000).

Atualmente a maior Corrida de Aventura no Brasil é o Ecomotion-Pro, que teve sua ultima edição realizada em outubro de 2008 nos Estados do Ceará, Piauí e Maranhão. A corrida teve um percurso de aproximadamente 530km e até 6 dias de duração (ECOMOTION, 2008).

2.1..2 Parâmetros fisiológicos da Corrida de Aventura

2.1.2.1 Características dos Atletas

Alguns estudos apresentaram as características físicas e fisiológicas dos atletas de Corrida de Aventura. Em estudo realizado por Ashley et al. (2006), antecedendo uma prova de 300 milhas, os autores analisaram 86 atletas de corrida de aventura e demonstraram a presença de um grupo com características físicas e fisiológicas heterogêneas. Esse estudo descreveu desde atletas profissionais com baixo percentual de gordura e excelentes condições cardio respiratórias a esportistas com elevado percentual de gordura, e condições cardio respiratórias normais assemelhando-se a atletas recreacionais.
Na etapa do mundial de Corrida de Aventura, de 2003, na Nova Zelândia, foram traçados o perfil das características de 12 atletas, 4 atletas da elite mundial, 4 atletas intermediários e 4 atletas novatos (Tabela 1).

6

tabela1

Nesse estudo, mais uma vez, confirma que dentro de uma mesma competição é encontrado perfis variados das características dos atletas participantes.

Durante uma simulação, em laboratório, de uma Corrida de Aventura baseada nas distâncias da prova internacional Ecomotion Pro 2003 (477 km), foram coletadas as medidas antropométricas e VO2pico de 7 atletas. Verificaram-se as seguintes médias: 31 anos, 75,4 kg, 174,7cm de estatura, 13,5% de massa gorda, 24,7, VO2pico na bicicleta de 54,7ml.Kg-1, VO2pico na corrida de 54,9ml.min-1.kg-1. (ZIMBERG et al., 2008). Embora foi relatado o percentual de gordura dos voluntários, a interpretação deste resultado deve ser cuidadosa já que a amostra foi composta de homens e mulheres. Um dado curioso deste estudo, foi que a medida de VO2pico não foi diferente entre o teste realizado na esteira ou na bicicleta.

Num quarto estudo que tinha como objetivo verificar os escores referentes à escala de dependência de exercício, qualidade de vida, bem como os escores indicativos de humor em atletas de corrida de aventura, 17 atletas de ambos os sexos com histórico de prática da modalidade de pelo menos três anos, com experiência em provas nacionais e internacionais e que figuram nas primeiras posições do ranking brasileiro apresentaram a seguintes características (média ± desvio-padrão):  da idade 31,11 ± 6,30 anos; estatura 1,73 ± 0,07cm; massa corporal 70,75 ± 7,96kg; índice de massa corpórea (IMC) 23,48 ± 1,48kg/m2; e consumo de oxigênio de 58,70± 6,63ml.min-1.kg-1 (ZIMBERG et al., 2008).

De acordo com os estudos acima, os atletas de corrida de aventura apresentam perfis variados podendo, numa mesma competição, participarem atletas profissionais em condições físicas de atletas de elite de outras modalidades e indivíduos com pouca experiência e não tão bem condicionados, demonstrando um perfil bastante heterogêneo desta modalidade esportiva.

2.1.2.2 Respostas cardiorespiratórias durante a prova

Em um estudo realizado durante a Transalp Challenge 2004, uma maratona de 8 dias de Mountain Bike, demonstrou que durante o percurso de 662km a média da frequência cardíaca (FC) dos atletas foi de 85% da FC máxima e em 36% do total do percurso foi mantido em zona de alta e muito alta intensidade, maior que 90% FC máxima. O estudo mostrou que esta corrida é fisiologicamente muito exigente, que envolve tanto o sistema de energia aeróbia quanto anaeróbia (WIRNITZER e KORNEXL, 2008).

Em um único artigo publicado na literatura descrevendo uma prova de Corrida de Aventura, Lucas et al. (2008) analisou a FC média durante a corrida internacional Southern Traverse. O percurso consistiu de 411 Km, com duração de 5 dias (120 horas), dividido em 14 fases aleatórias de trekking (3, 27, 70, 14 km), kayaking (22, 35, 25, 28 km), mountain bike (50,52, 40, 17 km), e coasteering (16, 12 km) realizado na Nova Zelândia.  A temperatura ambiental variou entre 5,2ºC e 22,3ºC. A freqüência cardíaca (FC) média de 12 atletas durante a corrida foi de 64% da FC máxima caindo para 41% nas 24 horas subseqüentes a prova e que em 80% do tempo da competição a freqüência cardíaca manteve-se abaixo de 60% da FCmáx. Estes dados estão representados na figura 1.

 

grafico1

 

Como podemos observar, com o único dado disponível na leteratura atual, as respostas cardio respiratórias são baixas caracterizando uma atividade de média intensidade durante os cinco dias de provas, com picos esporádicos de FC elevadas, podendo ser mais facilmente observado no início da competição.

2.1.2.3 Desidratação durante esporte de ultra-resistência

Em estudo realizado por Townes et al. (2004), em 248 corredores, durante a  corrida de Aventura de nível internacional (Subaru Primal Quest Expedition Adventure Race™), envolvendo corrida, mountain bike, canoagem, técnicas verticais e orientação realizada no Estados Unidos em julho de 2002, os autores descreveram incidência de lesões e de doenças ocorridas ao longo dos 380 km de percurso. A temperatura diária média foi de 26.6°C com variações de 24–28°C. A temperatura mínima média foi de 12°C (53.9°F) com uma variação entre 9–16°C. A umidade média foi de 48.9% variando de 38.0–62.0%. Curiosamente, o estudo reportou que 25% das desistências e abandonos da prova foram atribuídas a desidratação.

As corridas de aventura se assemelham pela sua duração com provas de ultra-resistência. Segundo revisão de literatura de Murray (1996), mesmo baixos níveis de desidratação (por exemplo, menos de 2% de perda de peso corporal) podem prejudicar o sistema cardiovascular e a resposta termorregulatória e reduzir a capacidade de realizar exercício. O calor também reduz a capacidade do atleta de treinar e competir, um efeito que pode ser independente do estado de hidratação. Mesmo que os atletas estejam bem hidratados, clima quente, por si só, pode reduzir o desempenho. O ótimo desempenho só é possível quando a desidratação e a hipertermia são minimizados através da ingestão de adequados volumes de fluidos durante o exercício. Recentes pesquisas têm demonstrado que o consumo do volume de fluidos aproximado ao volume da perda de suor mantém importantes funções fisiológicas e melhora significativamente o desempenho exercício, mesmo durante o exercício durando apenas 1 hora.

De acordo com Antunes (2006), a Corrida de Aventura é uma prova bastante exigente que associa não apenas um bom condicionamento físico, mas também um grande componente cognitivo, planejamento e a capacidade de trabalhar e permanecer em grupo. Além disso, durante toda a prova, os atletas são submetidos às mais diversas situações que variam desde alterações ambientais severas (calor, frio), privação do sono, cansaço, fadiga e até a redução do consumo alimentar e hídrico.

Segundo Kao et al. (2008), em estudo realizados em ultramaratonas de 12h e 24h, demonstrou que a perda hídrica em relação ao peso corporal foi de 2,8% nas corridas de 12h e de 5% na de 24h e em 26% dos atletas chegou a exceder  7% do peso corporal. Ele também ressalta que todos os atletas que tiveram um bom desempenho correndo mais de 200km nessa prova tiveram desidratação superior a 7% do peso corporal. Em ambas as ultramaratonas as diminuições de peso ocorreram principalmente durante as primeiras 8 horas, com o mais rápido declínio ocorrido entre 0 e 4 horas. Na ultramaratona de 24h, uma perda de peso considerável ocorreu entre 16 e 20 horas. Embora nenhum estudo anterior tenha medido o nível de desidratação durante uma prova de Corrida de Aventura, por suas características pode-se prever uma alta incidência de indivíduos desidratados.

2.1.2.4 Gasto Energético

De acordo com Zimberg et al. (2008), durante as Corridas de Aventuras, os atletas têm múltiplas áreas de transições para que os seus equipamentos e suprimentos nutricionais sejam fornecidos pela equipe de apoio. Devido as diferentes modalidades esportivas envolvidas, a distância de cada percurso, o relevo das provas, a estratégia de cada equipe e as exigências nutricionais variam entre os eventos.

Durante a simulação de uma Corrida de Aventura, em laboratório, o gasto energético foi estimado baseando-se no consumo de oxigênio. Este foi estimado a partir dos batimentos cardíacos registrados por monitores cardíacos, utilizados pelos atletas durante a corrida. A média de ingestão energética foi de 14.738 kcal e um gasto de 24.516 kcal, resultando em um déficit energético de 9.779kcal. A média do gasto de energia por hora de atividade foi de 365 kcal. (Zimberg et al., 2008)

Estudo realizado durante a corrida de ultra-resistência, Race Across América, em 2003, o gasto energético foi registrado continuamente, por monitor de freqüência cardíaca. Observou-se que o campeão dessa competição teve um gasto calórico total de 179.650 kcal e sua ingestão total foi de 96.124 kcal evidenciando uma deficiência de 83.526kcal ao final dos dez dias de prova (KNECHTLE; ENGGIST; JEHLE, 2005).

2.2 Metodologia

2.2.1 Amostra
Foram selecionados 9 atletas de Corrida de Aventura, competidores há mais de 3 anos: 5 do sexo masculino e 4 do sexo feminino. Foram excluídos da análise 3 atletas, por não completar a prova e apresentarem problemas com o Monitor de Freqüência Cardíaca (MFC) e nos registros dos inquéritos alimentares durante a competição. Portanto, os voluntários analisados foram 4 do sexo masculino e 2 do sexo feminino com média de idade de 30 (±3,1)anos, estatura 169 (±7,0) cm, peso 66,40± (10,6) kg.

2.2.2 Instrumentos
Para o registro da freqüência cardíaca (FC) foi utilizado o MFC da marca Polar ® modelo AXN 500, que registrou a FC a cada 60 segundos.
A massa corporal foi medida utilizando-se uma balança digital marca Sanitas, modelo SBG 20, com limite de 150 kg e escala de graduação de 0,1 kg. Os voluntários foram pesados descalços, vestindo apenas a camiseta e a bermuda, que apresentam peso médio de 320 grs, medida esta realizada em uma balança digital Plenna, modelo Grey, com capacidade de 2 kg e graduação de 1gr.

A estatura foi obtida com a utilização de uma trena marca Tramontina, de 3m, graduação de 1cm, modelo 43150/303, estando o voluntário descalço encostados na parede sem rodapé.
Foram mensuradas 9 dobras cutâneas utilizando plicômetro Cescorf com graduação de 1mm.

A condição térmica do ambiente da prova foi medida através de um monitor de estresse tremico (Metrosonic HS3700). Este equipamento mede a temperatura seca, úmida e de globo, e permite o cálculo do índice do Bulbo Úmido, Seco e Termômetro de Globo (IBUTG).

Para o cálculo da ingestão das calorias totais foi utilizado o software Diet Pro® 4.0.

2.2.3 Procedimentos
Inicialmente foram selecionados 9 atletas, praticantes a mais de 3 anos da modalidade para participarem do estudo. Os atletas foram previamente contatados por telefone para que se pudesse saber se atenderiam às condições necessárias à pesquisa. Foram dadas explicações detalhadas dos procedimentos do estudo e sondado o real interesse na sua participação.
O estudo foi executado durante a primeira etapa do Circuito das Grutas, valendo pelo ranking Brasileiro de Corrida de Aventura. A corrida foi realizada na cidade de Sete Lagoas -MG, e municípios adjacentes, em 21 de março de 2009. Seu percurso completo teve distância aproximada de 200 km divididos em 8 trechos, Mountain Bike (6, 50, 80 km), Trekking (5, 40, 12 km), Canoa Canadense (7 km) e Bike and Roller (5km). Cada trecho foi separado por uma zona de transição para troca de modalidade onde a equipe recebia alimento e suporte de uma equipe de apoio. As anotações de quantidades dos alimentos e líquidos ingeridos, bem como da temperatura local foram realizadas nessas áreas de transição.
Os voluntários que foram selecionados e aprovados para participarem da pesquisa, assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido (ANEXO A).

Para as avaliações do VO2max, utilizou-se um teste de campo de acordo com o protocolo corrida de campo de 1 milha e meia duas semanas antecedentes à prova. Também foram medidas a altura, massa corporal e pregas cutâneas. Foram utilizadas as nove e as medidas foram realizadas de acordo com Jackson e Pollock (1985).Os valores de dobras obtidos foram somados e os resultados estão apresentados na tabela1.

A massa corporal também foi medida antes da largada e logo após o término da prova e os voluntários foram orientados a esvaziar as bexigas. Após serem pesados, antes da largada, cada atleta recebeu um monitor de freqüência cardíaca, que foi instalado pelo pesquisador, além de receberem orientações para manter o equipamento no local ajustado. O relógio foi travado para evitar acionamentos desnecessários. O MFC foi instalado no tórax, na altura do processo xifóide do esterno, em cada atleta, pelo pesquisador e o relógio no punho de preferência do atleta.

Ao término da competição, na linha de chegada, à medida que cada atleta chegava era abordado pelo pesquisador, o MFC era retirado do tórax dos atletas. Os dados gerados pelos MFC’s foram transferidos para um computador e analisados pelo software Polar Pro Trainer 5®. Este software, dentre inúmeras informações, apresenta a FC máxima e a FC média durante todo o tempo de uso e em cada zona ou faixa de esforço, registrada a cada 60 segundos em tabela numérica e visualizado em gráfico com separação de zonas de esforço.
Cada atleta, nas áreas de transição, relatava o que haviam ingerido durante o percurso bem como o total de líquidos ingeridos. Para cálculo da ingestão das calorias totais foi utilizado o software Diet Pro® 4.0, e o líquido ingerido era calculado pela diferença entre o líquido levado em reservatório graduado (Camelback®) e o retornado. A temperatura do local de prova foi medida a cada hora do dia.

2.2.4 Análise estatística
A análise estatística foi feita de forma descritiva, caracterizando a amostra em função das variáveis selecionadas. Os resultados serão apresentados em gráficos, tabelas e texto dissertativo.

2.2.5 Cuidados éticos
Foram tomados cuidados éticos inerentes a um trabalho de pesquisa de campo. Todos os voluntários foram informados sobre os objetivos e procedimentos da pesquisa. Os princípios do anonimato e da voluntariedade da participação dos envolvidos neste estudo serão plenamente respeitados.

3. Resultados

As características antropométricas dos participantes deste estudo estão representadas, de forma descritiva, na Tabela 2.

tabela2

Seis atletas concluíram o percurso completo (aproximadamente 200km) da competição. Os atletas 1, 2, 3 e 4  pertencentes à mesma equipe gastaram 24 horas e 43 miutos e os atletas 5 e 6 completaram em 19 horas e 32 minutos e 28 horas 20 minutos, respectivamente.
A temperatura ambiental medida a cada horas através do termêmotro de bulbo úmido (WB), bulbo seco (DB) e temperatura de globo (GT) estão apresentadas no Gráfico 2.

grafico2

 

No Gráfico 3, temos o percentual do tempo de permanência em determinadas zonas de esforço (FC) dos participantes do estudo, de acordo com faixas pré-estabelecidas pelo software Polar Pro Trainer 5 ®.

grafico3

Em média foram ingeridas 5651 kcal durante o percurso total de prova, onde 80% dessas calorias foram obtidas a partir dos carboidratos, 6% das proteínas e 14% das gorduras, podendo ser observado com mais detalhes na tabela 3.

tabela3

 

Os 6 atletas tiveram um gasto calórico superior a quantidade de calorias ingeridas durante o percurso, criando um déficit de aproximadamente 7597 kcal. A ingestão média foi de 43% do total de kcal despendidas. Estas informações podem ser visualizadas na figura 4 e figura 5.

grafico4

grafico5

 

Na tabela 4 podemos observar as quantidades de líquidos ingeridos pelos participantes e  no gráfico 6 a perda de massa corporal ao final da prova.

tabela4

 

 

4. Discussão

Esse é o primeiro estudo em campo, realizado no Brasil, que analisou a variáveis fisiológicas e ambientais durante uma corrida de aventura real. Os principais achados deste estudo são os seguintes: aproximadamente 50% do tempo total de exercício foi realizado numa intensidade de exercício acima de 70% da FC máxima; embora as condições térmicas do ambiente não foram extremas os atletas apresentaram durante a prova diferenças no peso coporal de menos de 1 kg a 4,5kg aproximadamente; e a ingesta calórica total não foi suficiente para suprir metade das calorias gastas na prova.

Podemos observar que a FC analisada  durante a competição demonstrou uma intensidade média de esforço, ficando 75% do tempo abaixo dos 80% da intensidade máxima, esses mesmos achados são apresentados em outro estudo (LUCAS et al., 2008). Uma justificativa seria a incapacidade de manter níveis elevados de intensidade longas horas contínuas de atividade.

Durante a corrida de aventura analisada mediu-se as temperaturas no transcorrer da competição e a partir delas podemos perceber provável interferência destas na perda de líquidos corporais para manutenção da temperatura corpora e massa corporal. No presente estudo podemos observar que o atleta que mais apresentou perda de massa corporal foi o que menos líquidos  ingeriu e curiosamente foi o que demorou mais tempo a completar a prova, dentre os atletas estudados.

Em estudos sobre atividades de ultra-resistência uma conclusão comum é a constatação de uma elevada perda de massa corporal após a competição (MURRAY, 1996; KAO et al., 2008). Embora não exista dado específico sobre perda de massa corporal durante corrida de aventura, o presente estudo apresentou  similaridades nesse aspecto, com perdas de até 4,5kg da massa corporal nos atletas.

A ingestão de nutrientes durante a competição foi em média 5651Kcal e o gasto energético 13248Kcal criando um déficit de 7597Kcal, 43%, esse fato é encontrado em outro estudo, Zimberg et al. (2008) demonstra que durante simulação de uma corrida de Aventura os atletas também tiveram déficit  na ingestão calórica, 40%.  A ingestão de carboidratos pelos atletas foi em média 80% apontando para uma tentativa de manter as reservas de glicogênio e o prolongamento do exercício físico, ao contrario da conclusão do estudo de  Zimberg et al. (2008) que evidenciou uma ingestão inadequada de carboidratos e uma alta quantidade de proteína e gorduras.

A média dos níveis de VO2 dos atletas encontrados no presente estudo  foram de 53,3ml.min-1.kg-1 e valores bem parecidos 53,9ml.min-1.kg-1 foram descritos na literatura (LUCAS et al., 2008). O perfil antropométrico se assemelha a estudos existentes,  caracterizando uma classe heterogenia de competidores na Corrida de Aventura(LUCAS et al., 2008).

Foi um trabalho difícil de ser realizado devido a dificuldade da logística da prova. Lugares de difícil acesso e trajeto revelado horas antes do início da competição dificultam um plano de ação nas coletas de dados. A falta de um número maior de equipamentos como cardiofreqüêncímetros, limitaram o n amostral.

 

5. Conclusão

As informações obtidas no presente estudo podem contribuir para melhorar  a compreensão das necessidades  nutricionais dos atletas durante uma Corrida de Aventura, uma vez constatado que a ingesta calórica ao longo da prova representa aproximadamente 1/3 da demanda energética de cada atleta durante a competição.

Os valores da FC registrados durante a primeira etapa do Circuito das Grutas 2009, mostrou que esse evento de ultra-resistência é fisiologicamente muito exigente e envolvendo sistemas energéticos diferentes.

Esses resultados podem ser úteis para a concepção adequada de programas de treinamento e desenvolver específicas intervenções nutricionais para manter as demandas físicas e fisiológicas nesse tipo de evento.

 

REFERÊNCIAS

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