Novos tempos para a corrida de montanha e o trail run

A pausa forçada da pandemia trouxe momentos e sentimentos diferentes para cada um de nós e, após este período, é hora de encararmos os fatos e nos darmos conta que não existe um novo normal, e somente um novo tempo – do qual não conseguimos viver alheios.

Complexo e delicado sair de uma pandemia e adequar um método de treino, entender nosso real estado físico e psicológico, aplicar as cargas, intensidades e volumes. Além disso, organizar e repensar a rotina – que se bagunçou – sem contar o lidar com sequelas fisiológicas e emocionais da COVID-19.  

Pois bem, apesar de tudo, precisamos seguir… 

A corrida de montanha e o trail run são modalidades mais difundidas e praticadas na Europa e em alguns países na América. E mesmo olhando atentamente para lá, ainda carecemos de estudos e evidências científicas que possam desenvolver teses que nos torne seguros para realizar alguns métodos de treino. Adaptar e aplicar as cargas, volumes e intensidades cruzando dados de distância, ritmo, perfil altimétrico é desafiador para os treinadores considerando a geografia do Brasil.

Seguindo a teoria da adaptação, vamos tentando superar as limitações geográficas e seguimos evoluindo, sem dar muita atenção ao “pace”, assim como a montanha exige.

Para isso temos que adequar as sessões de treino ao nosso relevo, nossos métodos e principalmente nossos objetivos – que nem sempre são condizentes com nossa condição, principalmente neste momento que estamos vivendo. Criou-se uma tendência de que quanto mais o atleta corre, melhor ele corre – isso porque as diferenças diminuem conforme os Kms se estendem. Geralmente durante esse processo não tem se respeitado uma progressão coerente e metodológica de cargas de treinamento. Aí surgem a banalização da modalidade. riscos de lesão e também de frustração. Se tornar ultra virou uma obsessão. 

Em meio a este processo, por sua vez, assediando nossos pensamentos, aparecem as provas, que poderiam ter menos distâncias ofertadas em alguns momentos, mas quem organiza sabe que alongar a rota atrai sempre uma galera e viabiliza o evento economicamente. Nada justifica, mas quem é do meio e tem um pouco de empatia entende o quanto esse povo dos eventos esportivos sofreu e ainda sofre para correr atrás da máquina para se reinventar em um cenário completamente instável.

Fato é que os eventos esportivos também se transformaram – e ninguém fica de fora – desde UTMB até a pequena prova na sua cidade. A questão que fica é se estes eventos, na busca por se manterem ativos, inovando em um mercado que tem se demonstrado promissor pós pandemia, estão alinhados com princípios básicos que permeiam as modalidades em questão – ética, sustentabilidade, respeito à montanha.

Cabe aos corredores decidir quais eventos continuarão existindo e quais novos irão surgir. É fundamental neste processo optar por eventos que demonstrem coerência em seus discursos. Que tenham além de um apelo comercial, visual e desafiador, a capacidade de realizar um evento inteligente, seguro, responsável e sustentável gerando o mínimo possível de impacto no ambiente onde estão inseridos.

O Brasil, nos últimos tempos, começou alguns movimentos interessantes na área do treinamento – training camps, lives, assessorias presenciais e online, treinadores, atletas com marcas expressivas. Já na área de gestão, surgem organizações que visam regulamentar a modalidade CBAT. ABCT. Nos eventos, ligas, etapas nacionais, grandes atletas concentrados em um mesmo evento, polêmicas se a modalidade é considerada Sky Running ou não, e por aí vai. Estes acontecimentos vão dando corpo às modalidades e se for ordenado, houver ética, respeito, comprometimento e também gerenciamento das vaidades, o caminho será mais simples. 

Dito tudo isso, é hora de colocar uma folha em branco na mesa, organizar as ideias, olhar atento aos movimentos ao redor, pensar, e se posicionar – já que não se posicionar, também é se posicionar. Essencial também, consumir o treinamento, a assessoria esportiva, os equipamentos, os eventos de maneira consciente, responsável e sustentável. 

Por fim, é hora de reconstruir os pensamentos, decidir qual será a próxima montanha que iremos subir e o mais importante: como vamos fazer isso!

Rafael Vargas
@vargasrafaell
@flowinthemountains

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