Entrevista com Sidney Togumi sobre o UTMB 2012

Por Lilian Araujo - 27 Set 2012 - 10h41

Considera uma das competições de montanha mais desejadas do mundo, o Ultra Trail Du Mont – Blanc (UTMB) recebeu, em 2012, mais de 10 mil formulários de pré-inscrição. Destes, foram selecionados para a largada cerca de 2,5 mil atletas de todas as partes do mundo. Dentre os brasileiros finalistas, Sidney Togumi estreou na prova justamente na categoria principal, o UTMB. Com o corte imposto pela organização, devido ao mau tempo, o atleta percorreu 109 quilômetros debaixo de chuva e neve, enfrentando um desnível de 5.860 metros de altitude em 21h47 de prova.

Na conversa abaixo, Sidney Togumi conta um pouco a experiência de participar pela primeira vez do UTMB. Questionado se voltaria à competição, a resposta imediata: "Voltaria sim. Aliás, já vou me inscrever para o sorteio de 2013". Veja a seguir os principais trechos da entrevista:

Sidney Togumi na largada no UTMB

Adventuremag - Por que correr o Ultra Trail Du Mont – Blanc?
Sidney Togumi - O UTMB é a mais importante corrida de montanha do mundo. Atualmente é considerada a copa do mundo de ultra trail de montanha. Sonho em participar deste grande evento desde 2009, quando participei pela primeira vez do La Mision Race, na Patagônia Argentina. Como esta é uma das provas do mundo que concede os pontos necessários para se inscrever no UTMB, comecei por ela. Correr o UTMB é uma oportunidade de estar próximo aos melhores corredores de montanha do mundo e ainda uma oportunidade única de percorrer 168 km [distância original antes do corte por conta do clima], cruzando três países - França, Itália e Suíça – com as próprias pernas.

Advmag - Por que escolheu participar logo da categoria principal da prova, o UTMB?
ST – Optei pelo UTMB porque não sabia quando poderia retornar à Chamonix [cidade sede da competição], então me inscrevi direto na categoria principal. Na verdade, é uma opção pouco comum, pois muitos dos corredores participam primeiro do CCC (106 km e 6000 de desnível), cujo percurso é praticamente a segunda metade do UTMB. Estar na largada, este ano, foi umas das emoções mais marcantes que tive em toda a minha vida. Tentei registrar a largada com uma câmera, mas o nervosismo era tamanho que eu não consegui filmar, de tanto que minhas mãos tremiam. Na contagem regressiva para a largada, a adrenalina tomou conta de mim. Tive sentimentos de euforia e choro ao mesmo tempo. Levei alguns minutos para entrar no ritmo da prova, pois eu não conseguia parar de admirar todo o evento. Foi muito emocionante ver aquelas milhares de pessoas distribuídas pelas ruas de Chamonix, incentivando todos os corredores; o locutor oficial descrevendo a largada (mesmo eu não entendendo francês); a aglomeração de corredores pelas estreitas ruas de Chamonix. Foi tudo fantástico!

Advmag – Como foi receber a notícia que a prova sofreria mudanças de última hora?
ST - A organização anunciou a alteração do percurso seis horas antes da largada. O clima estava ruim acima de 1.800 m. Nevava, chovia e ventava muito, impossibilitando a passagem dos competidores. Por conta do clima, o percurso passou de 166 km para 109 km, com desnível positivo de 5.900 m. A prova deixaria de passar por três países e se concentraria apenas no território francês. A largada também sofreu alteração, passou para as 19 horas ao invés das 18h30 originais. Foi uma correria geral, todos atrás de mais informações sobre o percurso, altimetria, postos de apoio e outras possíveis alterações.

Advmag – O clima permaneceu ruim no dia da prova?
ST - O clima foi realmente o grande obstáculo da prova. A chuva e o frio castigaram praticamente durante toda a prova. Pegamos temperatura de -10 graus celsius. O risco era tamanho que, duas horas antes da largada, a organização anunciou a necessidade de quatro camadas de roupas no lugar das tradicionais três camadas.

Advmag - Quais são os principais desafios do UTMB?
ST – Considero quatro desafios principais. A começar pelo próprio clima, que é sempre uma incógnita. Nos últimos três anos a organização foi obrigada a cancelar e mudar o percurso, pois o clima na montanha impossibilitou a passagem dos atletas nos pontos mais altos da prova. A altimetria também é bastante relevante. A prova tem um total de 9.500m de desnível positivo no percurso original e, em 2012, o desnível chegou a 5.900m aproximadamente. Pude perceber que, para não ser pego pelos 11 horários de cortes distribuídos durante todo o percurso, é preciso ao menos correr em todas as descidas do percurso. Chamonix é simplesmente um parque de diversões para quem gosta de atividades outdoor. Inúmeras trilhas partem da cidade e as mesmas te levam às mais variadas altimetrias, passando por vilarejos a cidades da Suíça e Itália. Por fim, o tempo limite de 46 horas é outro grande desafio. Para realizar o percurso original é necessária uma média de quase 4km/h. Vale lembrar que a largada ocorre às 18h30 da sexta-feira, ou seja, o atleta deve estar preparado para enfrentar a noite logo no início da corrida. Mesmo correndo a noite, com a quantidade de participantes, é praticamente impossível ficar sozinho na prova.

Advmag - Em provas de longa distância é comum haver desistências por conta do psicológico. Em algum momento pensou em desistir?
ST - O perrengue foi constante, principalmente em razão da chuva e do frio. Ter feito corrida de aventura de expedição no passado me auxiliou muito na parte mental, mesmo passando muito frio. Graças a Deus o pensamento de desistir não passou pela minha cabeça. Consegui me administrar relativamente bem durante todo o percurso. Gostei muito do meu ritmo até o quilômetro 60, porém depois me senti um pouco cansado e diminui o ritmo. Estar molhado durante quase todo o tempo foi muito duro. Encontrei com a minha esposa Claudia no quilômetro 30 da prova e consegui trocar minhas luvas e meu fleece com ela. Isso foi imprescindível para que eu passasse a noite um pouco mais confortável. Acredito que isso tenha influenciado positivamente meu resultado final.

Advmag – A organização da prova oferece alguma estrutura de apoio aos atletas?
ST - Aproximadamente a cada três horas eu encontrava postos de reabastecimento. Não é necessário levar muita comida na mochila, pois nestes postos há farta oferta de água com ou sem gás, refrigerante, isotônico, frios, pães, queijos, bolos , chocolates, sopa, café, chá, barras de cereais e laranja.

Advmag – Qual o perfil médio dos atletas que participam do UTMB?
ST - Como o UTMB é considerado o campeonato mundial de ultra trail de montanha, participam os melhores corredores do mundo. A média de idade fica em torno de 43 anos. Em 2012 foram aproximadamente 2.450 inscritos e, com a mudança de percurso, apenas 20 deixaram de largar. A corrida de montanha é muito difundida na Europa e, por essa, razão imagino que a maioria dos competidores são praticantes espeficamente desta modalidade.

Advmag - Você parou para descansar em algum momento?
ST - Fiz os 109 km e 5900m +d em 21h47 minutos, com apenas duas paradas mais longas,  imagino que em torno de 30 ou 40 minutos. Precisei trocar as meias e me alimentar melhor em razão do desgaste.

Chegada de Sidney Togumi no UTMB 2012

Advmag - Você já correu vários La Mision Race. Existe alguma semelhança entre o La Mision e o UTMB?
ST - São provas bem diferentes. O La Mision é uma prova na qual o competidor precisa ser totalmente auto-suficiente, carregando praticamente toda a alimentação, vestuário e todos os equipamentos necessários para cumprir o percurso em até três dias. O competidor vai para a prova sem depender em nada dos organizadores. Com isso, a mochila acaba pesando entre 6 quilos a 12 kg e o ritmo da prova cai. Já o UTMB é uma prova mais rápida e, por oferecer diversos postos de abastecimento, a mochila pesa por volta de 3,5kg. O competidor acaba desenvolvendo uma velocidade média maior. Em Chamonix, os competidores vão para o evento para depender da organização com relação à comida e hidratação. Para se ter uma idéia, no La mision a velocidade média do vencedor fica em torno de 5km/h, enquanto que no UTMB fica em 8km/h.

Advmag - Você voltaria para o UTMB? Faria algo diferente para se preparar para a prova?
ST - Voltaria sim. Tanto que, já vou me inscrever novamente para o sorteio de 2013. Pretendo treinar com mochilas mais pesadas para desenvolver tanto a força quanto a resistência muscular. Também vou aumentar o volume de treinamentos e iniciar um trabalho específico para a prova o mais cedo possível.

Lilian Araujo
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27 Set 2012 - 10h41 | geral |
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