Um Brou com a Tubaína na ARWS Belize 2018 – Maya Mountain Adventure Challenge

Eu estava tomando tranquilamente um açai no fim da tarde de uma quinta feira em BH quando meu telefone tocou e era o Igor Petric, corredor de aventura que conheço há tempos e tenho em alta consideração como pessoa e atleta. Sem muita cerimônia me chamou para substituir o Diogo Rehder na equipe Tubaína que ia pro ARWS Belize. Eu nem sabia direito onde era o tal Belize, mas depois de consultar minha agenda dei o sim! Faltava menos de uma semana pra viagem então a correria foi intensa, mas por sorte a lista de equipamentos era pequena e os treinamentos estavam em dia :). Bora pra Belize então!

Como sempre a jornada é imensa…sair de BH a 1h30 da manhã de 6ª feira, chorar sem solução para a atendente da Copa Airlines aliviar a taxa extra de bagagem (acabei pagando 150 dólares na ida e 100 na volta), viagem até o Panamá, escala longa, encontro com o Leandro da Teiú no aeroporto, viagem final para Belize.

Finalmente às 17h de 6ª feira cheguei ao Hotel Cahal Village, en San Ignacio, cidade onde ficam as famosas Montanhas Maias. Encontrei o restante da equipe que já estava lá desde 3ª feira: o Igor que me fez o convite, o Guillaume Habouzit e a Marina Richwin. Saímos pra comer uma pizza e falamos um pouco da estratégia da equipe e no sábado de manhã nos preparamos pra receber os mapas e ver o briefing da prova. A largada seria domingo ao meio dia.

Às 14h pegamos os 17 mapas A3 que faziam um verdadeiro labirinto pra serem unidos, e depois de muita peleja e de um confuso briefing (não compreendemos direito as regras da prova e algumas alterações feitas no mapa não foram totalmente esclarecidas), fomos para a última noite de sono antes da largada.

25/03 – Domingo em San Ignacio – Largada de Canoagem – 35km – 3h40
Sob um sol escaldante, partimos do hotel caminhando juntos com as outras 10 equipes até uma das ponte da cidade, onde seria dada a largada. Tiramos a foto oficial e, de repente, partimos correndo para um sprint de 200m até o outro lado do rio onde estavam as canoas. As embarcações eram diferentes umas das outras, mas como não sabíamos muito como escolher as “melhores” acabamos optando por pegar as primeiras que estavam à mão. Saímos remando rápido e em pouco tempo nos ultrapassaram as 3 equipes que iam brigar pela ponta da prova o tempo todo: os franceses da Naturex e Agde e os estadunidenses da Bones. Logo atrás desse grupo seguíamos junto com a equipe do Leandro da Teiú, com quem íamos disputar boa parte da prova. Remada foi tranquila. Muito calor, mas as paisagens eram bonitas e o rio empurrava um pouco. Terminamos a sessão em 5o, logo atrás da Teiú, e vimos as equipes da ponta ainda na transição. Bom sinal.

2a pernada: 60km de bike – 6h
Fizemos uma transição rápida, em menos de 20 minutos tiramos as canoas da água, tiramos os equipamentos, pegamos as caixas de bike, montamos as bikes, nos hidratamos e comemos e saímos. Estávamos na 4a posição. O calor forte me deixou lento no começo dessa bike e o Igor me ajudou bastante até eu me restabelecer. Tínhamos 3 PC´s pra pegar em qualquer ordem, com alguma opção de caminhos entre trilhas mais curtas e estradas mais longas porém mais certeiras. A noite caiu durante esse pedal e seguimos muito mais confortáveis com o frescor e a falta do sol queimando nossa cabeça. Optamos por uma estratégia conservadora e terminamos a seção sem muitos problemas, ainda na 4a colocação.

3a: Canoagem 35km – 3h40
Chegamos de bike na transição e nessa canoagem teríamos que levar as bikes com a gente nas canoas. Tínhamos testado tirando apenas a roda dianteira, mas mudamos de estratégia ao ver as outras equipe mais confortáveis sem as 2 rodas da bike. Entramos no rio em 5o, com a Teiu dessa vez fazendo uma transição mais rápida. A noite era de lua quase cheia e mantivemos as lanternas apagadas quase o tempo todo. Neste trecho tivemos algumas visões lindas, com umas aves brancas quase brilhantes na escura noite. Fantasmagórico e sensacional. Umas pequenas corredeiras e árvores no caminho não impediram nosso progresso e saímos da água meio com frio mas animados pra próxima bike.

4a: Bike 40km – Primeiros problemas de orientação (3h)
Encontramos mais uma vez a Teiu na transição e também a SportOne, francesa, e montamos as bikes o mais rápido que o frio permitiu e partimos noite adentro. Começamos num ritmo bom, encontrando os caminhos até que nos deparamos com a primeira plantação de laranja da prova. Era sempre um labirinto. Perdemos um pouco de tempo pra atravessar um rio e depois dele seguimos uma trilha alagada de lama por quase uma hora até chegar numa estrada maior onde estava o PC8. Era num riozinho e quando chegamos no lugar, não encontramos nada. No RaceBook falava que o PC estava deslocado a noroeste do local plotado no mapa. Então começamos a procurar no mato ao redor do riozinho, nas estradinhas antes e depois. Cerca de 1 hora se foi nesse processo até que decidimos tirar uma foto do lugar
acreditando que o PC não estava por ali. Mais bike até o asfalto que levava à próxima transição. Chegamos às 05h, fim do Darkzone e vimos a Naturex e Bones correndo no asfalto em direção ao rapel. Mesmo com o tempo perdido, estávamos quase 3h adiantados em relação ao nosso cronograma. Mas sabíamos que o pior estava por vir.

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5a: Trekking + Rapel + Caving + Trekking no Vietnã (31h)
Fizemos uma transição de uma hora, mais lenta que o planejado. Mas vínhamos cansados e frustrados por não achar o PC8 (na transição nos informaram que as outras equipes tinham encontrado). O parque onde era a transição ofereceu aos atletas café, chá, sucos, bolos e biscoitos. Em provas de expedição, qualquer comida diferente das que carregamos vem com um sabor muito especial :). Guardamos as bikes, enchemos com a bomba de pé as câmaras de ar de caminhão que usaríamos no caving (e que teríamos que carregar durante umas 4h antes de usá-las) e saímos às 05h30 carregados de comida e equipamentos para a maior pernada da prova. Trekking começou no asfalto, onde encontramos a francesa Agdes voltando pra transição por terem esquecido o mapa!! Seguimos o caminho, pedimos numa casa pra deixar as bóias enquanto fazíamos o bate e volta do rapel e seguimos pelos laranjais até entrar numa trilha de selva subindo até o Hole (buraco maluco) onde era o rapel. Foi surreal! A luz do amanhecer batendo nas paredes rochosas enquanto descíamos 100m negativos até o fundo do buraco. De lá subimos por escadas e trilhas íngremes até voltarmos pra estrada e caminhamos rápido chupando laranja e nos refrescando no rio que em breve se tornaria subterrâneo. Às 11h entramos no trecho mais legal da prova. Um rio com correnteza que atravessava uma sequência de cavernas intermináveis. Nunca vou esquecer esses momentos. Em alguns trechos tinha até corredeiras no rio…realmente diferenciado. Às 13h saímos para o trekking sob um calor sufocante, deixando na “transição” a equipe Teiu, que optou por não levar nenhum tipo de bóia e teve que nadar e andar durante todo o caving. Perderam o melhor da prova..hehe.

O mapa que vinha apresentando incoerências desde o início da prova neste trecho parou mesmo de funcionar. Nos embrenhamos no laranjal, numa mineradora, na beira de rio, num rasga mato e nada. Não conseguimos sair do lugar. Frustrados, no dia mais quente da prova, às 17h voltamos para a ponte. A moral baixou, o sono bateu. Decidimos dormir um pouco e o Igor foi até a casa ao lado pedir pra fazerem comida pra gente. Acordamos às 17h40 e comemos deliciosamente um mega prato de arroz com ovo e às 18h estávamos outra vez a caminho, escolhendo uma rota conservadora por estradas. 3h depois chegamos na entrada da trilha que prometia ser o trecho mais casca da prova. A gangrena era tanta que a organização marcou a trilha toda com fitas e marcas nas árvores. Começamos a trilha que passava por enormes cavernas. Já estávamos na 2a noite da prova e tínhamos dormido menos de 1h até então, mas seguimos batendo papo e fazendo brincadeiras para passar o tempo. Depois de atravessar o mesmo rio mais de 10 vezes, e tendo pelejado um pouco para achar um PC, ao amanhecer da 3a feira demos num lugar sem saída. Mais uma vez encontramos a galera Teiu dormindo porque tinham passado um bom tempo procurando o caminho que no mapa parecia ser fácil, mas na realidade não existia.

Amanheceu e estávamos num canavial procurando a saída, que parecia não existir. Olhando bem detalhadamente o mapa, parecia que a solução era uma trilha do outro lado do rio na encosta de um morro. Mas não tinha marca nenhuma e um belo rasga mato pra chegar até ali. Caímos pra dentro do rio e seguimos dentro dele por um tempo, e me lembrei dos filmes do Vietnã. Logo o rio que vinha do lago onde era o próximo PC foi alcançado. O lago era o Five Blues Lake, e a cor transparente do rio dava a entender o porque do nome. Seguimos na trilha com marcas de facão, alternando com trechos contra a forte corrente dentro do rio por 2h30 até que após atravessar o rio uma última vez chegamos ao mirante do lago. Às 14h finalmente alcançamos a transição, cansados, com fome, com calor e devorados por mosquitos. Éramos a última equipe sem cortes, 2h atrás do grupo que tinha a Teiu e a SportOne. Ainda precisávamos dormir e comer, fazendo com que nosso atraso ficasse em mais de 4h. 🙁

6a: Bike 120km – 16h
Tendo dormido mal por causa dos mosquitos, mas alimentados e com ganas de recuperar o tempo perdido, saímos para a bike que começava num rápido trecho de asfalto e aí novas complicações vieram.
Tínhamos que cruzar um rio bem grande algumas vezes e encontrar uma trilha logo depois de um encontro de rios na outra margem. Vínhamos dentro do rio dispostos a seguir com as bikes por ali até que no finalzinho da luz do dia encontramos uma alternativa e rapidinho estávamos na trilha do mapa que parecia levar sem problemas até o PC19, na cachoeira. Maaaaas a ilusão durou pouco e estávamos de novo dentro da água e procurando trilha. Numas casas abandonadas decidimos fazer uma volta conservadora que aumentava uns 8km, mas era mais segura aparentemente. Realmente depois de muitos sobe e desce, ainda mais cruzamentos de rio, pancadas de chuva na fria noite, finalmente chegamos na cachoeira, que era um bate e volta. Daí pedalamos forte na madrugada até o amanhecer e chegamos às 9h da quarta feira na transição para o 2o trekking dificil da prova.

7a: Trekking pelo asfalto 30k – 5h
Lavamos as bikes na transição, comemos bem, nos hidratamos e fomos informados que o trekking estava tomando muito tempo das equipes e que era pra passarmos direto pelos PC23 e 24 e irmos direto pra transição. Não entendemos direito se era um corte, mas seguimos pelo asfalto caminhando e trotando forte até chegar num barzinho onde pela primeira vez compramos comida e coca cola gelada! Burritos con huevos caíram muito bem e demos uma dormidinha para passar o sono brutal que vinha nos acometendo. Seguimos pelo asfalto e depois entramos numa reta sem fim a 50 graus de calor até o rio da transição. Quando chegamos lá, fomos informados que éramos apenas a 2a equipe a passar por ali, e que todo mundo estava pelejando no trekking pela savana.

8a: Bike 45km – 8h
Saímos da transição mais uma vez optando por uma volta conservadora e chegamos à Village of Peace, onde mais uma vez paramos para comer. Seguimos numa bike rápida que passou pela ponte da 1a transição e aí entrava na região de montanhas onde estava a transição para o trecho final da prova. Vínhamos seguindo bem até que o mapa se complicou mais uma vez na região do Lower Barton Creek, que é lugar de uma comunidade que se chama “Menonnites” e vive sem nenhum tipo de tecnologia. Encontramos uns caras em carroças com lâmpadas a óleo, roupas costuradas por eles mesmo e que não pareciam muito contentes com nossa passagem por ali. Logo chegamos ao rio que era uma boa referência, mas a trilha pela qual tínhamos que seguir não existia. Voltamos e navegamos outra vez até que entramos no último labirinto dos laranjais da prova. Mas não conseguimos sair. Frustrados, cansados e com frio pelejamos por ali durante um tempo até que de repente demos com uma plaquinha “Caves” que era onde ficava a transição.

Chegamos, fomos pegar o PC26 de canoa dentro de uma caverna alagada e depois à 1h fomos dormir o resto da darkzone, que acabava às 3h. 2h50 chamei o Igor e a Marina e quando voltei pra área do restaurante, as equipes estavam discutindo se valia a pena entrar no trecho seguinte, que demoraria 12h segundo a organização para uma equipe forte, sendo que a prova tinha o horário limite de 17h. Discussões intermináveis, argumentos, e por fim todos que estavam por ali desistiram de fazer o trekking final + packraft, indo de bike até a chegada.
Foi uma decisão consciente e racional, mas mesmo assim estávamos arrasados por não finalizar a prova proposta.

Chegamos na transição para o packraft, assinamos a planilha e começamos a descida que em menos de uma hora nos levou de volta a San Ignacio, onde chegamos ao meio dia de 5a feira, tendo completado 96h de uma expedição incrível.

Ao longo do dia as outras equipes chegaram e cada uma com suas estórias malucas. Todos estávamos conscientes que foi uma corrida que atravessou uma região incrível, e que com certeza demos tudo que tínhamos para terminá-la da melhor forma possível.

A organização tem critérios meio estranhos para definir as posições da chegada, mas mesmo assim foi uma experiência incrível.

Fica meu agradecimento eterno aos companheiros de equipe Igor, Marina e Guillaume, e ao capitão Diogo Rehder, a quem tive a honra de substituir de última hora. Dei meu melhor pela equipe e tive como contrapartida uma das provas mais legais em relação aos meus companheiros de equipe! Valeu galeraaaaa!

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