Decathlon está de olho no mercado de trail running

A francesa Decathlon, gigante dos mercados esportivo e de aventura, está de olho no mercado brasileiro de trail running. A mais recente loja inaugurada pelo grupo, na Avenida Paulista, em São Paulo, possui, pela primeira vez, uma área específica para a modalidade, num modelo que poderá se repetir em outras das suas 25 unidades no País.

Esse movimento está sendo feito, antes de tudo, com base nos números da própria empresa (no ano passado, as vendas do segmento de trail running cresceram a um ritmo de dois dígitos) e em pesquisas de mercado. “Fizemos um levantamento junto a clubes e grupos de corrida de rua. E o resultado mostrou que 17% dos participantes desses grupos já correram ou têm vontade de correr uma prova de montanha. Considerando que temos cerca de 5 milhões de praticantes de corrida de rua, chegamos a um público potencial de cerca de 850 mil atletas no trail running”, afirma o gerente de produtos da Kalenji – marca da Decathlon voltada para corridas de rua -, Fábio Cedano.

São números como esses que têm animado o grupo a investir na modalidade. Para além de oferecer um espaço específico para as corridas de montanha na nova loja, a rede francesa está trazendo para o país a linha Kiprun, específica para trail running, com três modelos, um híbrido para provas asfalto-trilha, um intermediário, para corridas em torno de cinco horas (que testaremos aqui na Adventuremag) e o mais sofisticado, destinado a ultra maratonas em montanha.

Por fim, investimento passa por uma estratégia adotada pelo grupo francês desde sua fundação: a contratação de um time de colaboradores que sejam, de fato, envolvidos com o esporte e que possam, dessa maneira, manter a empresa em sintonia com a demanda dos atletas e as principais tendências do esporte.

Um exemplo dessa política é o do corredor de montanha Kleber Freitas, duas Ultra Internacional dos Anjos (UIA, prova de 235 quilômetros na Serra da Mantiqueira) no currículo e vendedor na recém-inaugurada unidade da Paulista – e que entrevistamos em uma visita à loja. Quando não está na unidade, Freitas se dedica aos treinamentos ou ao trabalho de guia de montanha na Serra Fina.

“Não podemos perder de vista a importância de termos colaboradores que vivam o esporte no dia a dia. Até porque, num mercado cada vez mais caracterizado pela facilidade de obter informações e fazer compras online, o aspecto humano é um diferencial”, explica o gerente de esportes de montanha, Gustavo Donatti, ele mesmo um apaixonado por montanha e que tem, no currículo, por exemplo, a conquista do Aconcágua, montanha mais alta das Américas, com 6.900 metros.

Nesta entrevista à Adventuremag, Donatti falou sobre os planos da Decathlon para o segmento de aventura, os desafios do segmento de trail running e sobre seu envolvimento pessoal com o mundo das trilhas.

Adventuremag (AM) – Comecemos pelo começo: como surgiu a Decathlon?
Gustavo Donatti (GD) – A empresa surgiu em 1976 com o empresário Michel Leclercq. Ele trabalhava num estabelecimento comercial do tio e resolveu ter o próprio negócio, se possível algo ligado a esporte. Então, abriu uma loja de bicicletas. Mas, logo, percebeu que teria mais sucesso se apostasse num modelo diferente, que reunisse o maior número de esportes possível em mesmo ponto de vendas. Esse modelo fez tanto sucesso que é adotado até hoje. São mais de 1,3 mil lojas em 40 países. No Brasil, a primeira loja foi inaugurada em 2001, em Campinas. Hoje, são 25 estabelecimentos.

AM – Nos últimos anos, com o desenvolvimento do comércio eletrônico, esse modelo de negócios, focado numa grande variedade de esportes e em preços competitivos continua dando resultados?
GD – Você tocou num ponto interessante. Só preço não atrai mais. E mesmo conhecer um produto a fundo pode não ser suficiente. O espaço das lojas, hoje em dia, tem de ter algo a mais. Por exemplo, uma troca de experiência entre vendedor e cliente, do tipo, ‘você fez tal prova, como foi?’ Por mais que tenhamos acesso à tecnologia, as pessoas vão continuar sendo pessoas, buscando essa troca de experiência. É algo que está se perdendo com as novas tecnologias.

AM – Mas, para ter esse nível de interação, é preciso que os funcionários tenham algum envolvimento com os esportes que vendem, sejam praticantes desses esportes…
GD – Sem dúvida. Vou dar um exemplo prático. Há pouco tempo, tivemos de recrutar um retail suplier (cargo equivalente ao de comprador) para produtos da linha Quechua. Eu queria uma pessoa com conhecimento específico de escalada, um nicho pequeno ao qual nunca tivemos um profissional dedicado. Assim, a primeira coisa que pedi à equipe de RH foi que esse colaborador fosse, de fato, um escalador. Então, começamos a buscar pessoas com esse perfil em comunidades de escaladores nas redes sociais e fazendo contato, por exemplo, com o pessoal do CAP (Clube Alpino Paulista) e com escaladores que conheço, como o Máximo Kausch (um dos maiores escaladores brasileiros). Depois que achamos algumas pessoas com esse perfil, fomos ver outras características para a vaga, como domínio de inglês e habilidades comerciais. E estou impressionado com o resultado. A pessoa escolhida trabalha com brilho nos olhos, está apaixonada pelo trabalho…

AM – Afinal, ele fala o dia inteiro do assunto que mais gosta…
GD – Exatamente!

AM – E os colaboradores têm tendo tempo para se dedicar ao esporte fora da rotina de trabalho?
GD – Sim. O profissional escolhido para essa vaga faz escalada indoor há 10 anos está, inclusive, lutando por uma vaga para ir para a próxima Olimpíada (a modalidade será disputada pela primeira vez nos Jogos Olímpicos de Tóquio, em 2020) e é um dos atletas mais competitivos da modalidade. Ele trabalha das 08h às 18h e, depois do trabalho, vai treinar. E todos os finais de semana, vai para São Bento do Sapucaí, onde possui uma casa. Ele tem o trabalho normal, mas se dedica também ao esporte. Sempre me pergunto se uma pessoa assim seria feliz vendendo parafusos numa loja de material de construção (risos).

AM – Então, isso é estimulado…
GD – Veja, não é uma condição para fazer parte do nosso time, mas, se o cara não vive o esporte, fica desconectado do mercado, das tendências. Eu, mesmo, escalei durante um tempo, mas depois migrei para esportes de endurance. Então, esse profissional que contratamos para a área de escalada já me deu alguns toques sobre tendências que eu não conhecia no tempo em que escalava. Quanto mais atualizado esse cara estiver, melhor para a tomada de decisões comerciais.

Leia neste link a entrevista completa com Gustavo Donatti sobre o mercado de trail running

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *